Com uma premissa de saúde pública, uma agenda política totalitária avançou sem resistência
Após Adolf Hitler (1889-1945) e sua gangue do Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães (NSDAP) conquistarem o poder absoluto na Alemanha, se iniciou o processo de implementação das suas políticas racialistas totalitárias.
As perseguições começam
A cada dia, novas legislações burocráticas (de caráter econômico, político, social e sanitário) surgiam com a intenção de separar os indivíduos de grupos ditos ”indesejáveis” da ”Volksgemeinschaft” (Comunidade Racial Alemã) e sua ”Volksgenossen” (Comunidade de Sangue).
Os Judeus
No caso dos judeus, por exemplo, não estavam mais autorizados a servir como oficiais na Wehrmacht (maio de 1935), proibidos de trabalhar como agentes fiscais ou consultores (janeiro de 1936) e proibidos de trabalhar como veterinários (abril de 1936). E mais!
- Autoridades municipais de Berlim excluem crianças judias das escolas estaduais de lá (abril de 1937);
- Não têm mais permissão para mudar seu sobrenome ou usar um pseudônimo (janeiro de 1938);
- São proibidos de trabalhar como leiloeiros (fevereiro de 1938);
- São proibidos de possuir lojas de armas ou de comercializar armas (julho de 1938);
- Banidos de spas e resorts de saúde (julho de 1938);
- Devem adicionar “Israel” ou “Sara” aos seus nomes próprios (agosto de 1938);
- Médicos judeus são proibidos por lei de tratar pacientes não judeus (setembro de 1938);
- Os judeus devem ter um grande ‘J’ vermelho estampado em seus passaportes (outubro de 1938);
- Estão proibidos de circular livremente pela Alemanha (novembro de 1938);
- Não estão mais autorizados a manter ou usar pombos-correios (novembro de 1938); não podem mais ter carro ou carteira de motorista (dezembro de 1938);
- Todos os acadêmicos, professores e alunos judeus são expulsos das universidades (dezembro de 1938);
- Os judeus são obrigados a entregar metais preciosos e pedras preciosas (fevereiro de 1939); estão proibidos de comprar bilhetes de loteria ou reivindicar prêmios (agosto de 1939);
- Não têm mais permissão para instalar, manter ou usar telefones (julho de 1940), etc.
Ambições genocidas através dos meios jurídicos
Ao contrário do que as pessoas na atualidade podem imaginar, as perseguições totalitárias do regime nacional-socialista alemão aos grupos ocorreram de forma gradual.
O resultado dessas leis foi a marginalização e a expulsão efetiva dos judeus alemães da sociedade, cultura, comércio e negócios da Alemanha. Se tornando invisíveis socialmente e gerando o precedente para os assassinatos em massas.
Agenda Totalitária em nome da ”Saúde Pública”
Após unificar a Alemanha em 1871, Bismarck criou o primeiro ”Sistema Nacional de Saúde” do mundo. Os Nacionais-Socialistas herdaram essa tradição, porém, havia uma diferença entre o sistema de saúde nazista e os sistemas anteriores do Império Alemão e a República de Weimar. O sistema fora reorganizado sob um estrito controle do Governo Central, do modo que todas as atividades se reportavam diretamente a Berlim.
Com o aparato estatal de saúde em mãos, os Nacionais-Socialistas retratavam os seus alvos como vermes e parasitas. A propaganda ideológica se concentrava na ideia de que a “pureza racial”, estava ”sob ataque” por esses grupos étnicos. Retratando seus oponentes como organismos doentes que ameaçavam a saúde geral da comunidade. A velha premissa totalitária de desprezar o indivíduo em nome do coletivo.
Como resultado dessa propaganda, grupos de judeus, ciganos, etc. Foram isolados cada vez mais do restante da população (tanto na Alemanha, como nos países ocupados). Uma premissa sanitária, repetida incansavelmente, serviu de justificativa para o avanço de uma agenda política-ideológica, que no fim – nada tinha de relação com a saúde pública.
O Passaporte Sanitário
A premissa de todo regime totalitário é o controle. Tanto político, como econômico, seja na veiculação de informações ou no livre transito de pessoas (seja internamente ou externamente).
Para isso, os Nacionais-Socialistas desenvolveram documentos especiais para cercear o direito de ir e vir dos habitantes da Alemanha e dos países ocupados com o início da Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
Em 1º de Outubro de 1938, entrou em vigor na Alemanha a portaria de criação da ”Kennkarte” (Carteira de Identidade). Nos países ocupados, a cor de cada ”Kennkarte” era baseada na etnia. Os poloneses tinham cinzas; Judeus e romanos, amarelo; Russos e outros eslavos não-poloneses, azul.
Em 5 de Outubro de 1938, o Ministério do Interior do Reich invalidou todos os passaportes alemães em poder de judeus. Os judeus deveriam entregar seus passaportes antigos, que só seriam revalidados depois que a letra “J” fosse estampada neles.
O governo exigia que os judeus se identificassem de forma a separá-los permanentemente do resto da população alemã. Todos os judeus alemães eram obrigados a portar carteiras de identidade que indicavam sua ascendência. Com a identificação do grupo, a medida pavimentou o caminho para uma perseguição mais radical.
Esses documentos de controle totalitário foram criados com base em regulamentos racialistas, sob um verniz de quesitos sanitários.
Se permitirmos na sociedade a construção de um convívio em que é preciso ter suspeita ou medo uns dos outros, a menos que se possa apresentar provas, então é preciso se perguntar (…) Queremos realmente voltar nessa direção?
Referência
Propaganda Poster: “Jews Are Lice: They Cause Typhus”, United States Holocaust Memorial Museum, acessado pela última vez em 05 de Outubro de 2021 – https://perspectives.ushmm.org/item/propaganda-poster-jews-are-lice-they-cause-typhus
In the Name of Public Health — Nazi Racial Hygiene (Susan Bachrach, Ph.D.), United States Holocaust Memorial Museumm, acessado pela última vez em 05 de Outubro de 2021 – https://www.ushmm.org/m/pdfs/07192004-nazi-racial-hygiene-bachrach.pdf
ANTI-JEWISH LAWS, Alpha History, acessado pela última vez em 05 de Outubro de 2021 – https://alphahistory.com/holocaust/anti-jewish-laws/
Em nome de interesses pessoais, muitos abdicam do pensamento crítico, engolem abusos e sorriem para quem desprezam. Abdicar de pensar também é crime
— Hannah Arendt